Quando o chão vira texto
A historiadora e antropóloga Paula Janovitch fala sobre a "gramática dos caminhantes", que pode ser percebida ao se andar a pé pela cidade.
Novo romance da autora britânico-canadense realça oposições tanto na narrativa quanto na construção das personagens
Por Marcio Aquiles
Em uma manhã em Paris, após uma aventura etílica com um escritor famoso e egocêntrico, a narradora M se depara com um autorretrato de L e é atingida por uma espécie de epifania. Quinze anos depois, morando com o marido numa região pantanosa, onde uma “Segunda Casa” – que dá nome ao novo romance de Rachel Cusk – costuma de vez em quando abrigar hóspedes, decide convidar o pintor para uma temporada no local. Os motivos do convite não são misteriosos, mas tampouco evidentes, pois não é nítido se o que a motiva vem de uma admiração artística, um sentimento platônico ou de um profundo tédio existencial – seja com sua vida ou o casamento.
Assine nossa newsletter para ficar por dentro de tudo o que rola no centro
Inequívoca, contudo, é a contraposição explícita entre as duas personagens. Se M o convida para a serenidade do pântano, com suas “tempestades”, “o mar que às vezes fica rugindo” para depois cobrir “tudo com um lençol vítreo de água”, L recebe o convite do terraço de um restaurante de Malibu, protegendo os “olhos de um pôr do sol sanguinolento” que remete “a fogo eterno e enxofre”. Assim também pode ser definida a personalidade dos dois, profundamente antagônicas, como frio e calor, água e fogo.
M é insegura, tenta agradar a todo custo e vive preocupada com a opinião alheia. L, por sua vez, é pernóstico, arrogante e narcisista. Essas polarizações atravessam todo o enredo, e a relação com a filha Justine não escapa a elas: “Percebi, ao pensar nisso, que meu princípio primordial na criação da minha filha havia sido simplesmente fazer com ela o oposto do que tinham feito comigo”. Nem a com o marido: “Mas não é função de Tony trocar de lugar comigo, nem eu com ele. Somos pessoas diferentes, cada um tem um papel diferente a desempenhar”.
As desilusões da anfitriã começam ainda antes da chegada de L, ao receber um casual “decidi ir para outro lugar” do artista, tudo isso depois de ter feito uma faxina hercúlea no espaço. Quando finalmente vem, traz consigo, sem avisar antes, afeito que está a receber favores de aduladores, a amiga/amante Brett.
A partir daí, pode-se dizer tanto nada acontece quanto tudo acontece, pois “Segunda Casa” é um livro sobre nada e sobre tudo ao mesmo tempo, depende da perspectiva ou do ânimo do leitor no momento. Sem ter a informação de que toma por base as memórias de Mabel Dodge Luhan, que nos anos 1920 recebeu D.H. Lawrence em sua colônia de artistas no Novo México, pode-se ficar com aquela sensação incômoda: precisava mesmo um livro sobre isso? Ou, ao contrário, interpretar a dimensão metafísica daquelas relações como microcosmo humano tanto para temas nobres (amor, amizade, arte) quanto rasteiros (vergonha alheia, banalidades cotidianas). Pensando bem, talvez essa seja a tônica dominante na obra de Rachel Cusk desde “Esboço” (2014). Sem os artifícios de reviravoltas inesperadas ou acontecimentos extraordinários, a autora consegue extrair, com naturalidade e sem forçar a mão nos dispositivos narrativos, a seiva literária do trivial.
@marcioaquiles
Leia também: A POESIA SONORA E VISUAL NO ESPETÁCULO “MORTE E VIDA SEVERINA”
A historiadora e antropóloga Paula Janovitch fala sobre a "gramática dos caminhantes", que pode ser percebida ao se andar a pé pela cidade.
Pastilhas estão sendo retiradas e serão trocadas por outras semelhantes, segundo nota oficial da Prefeitura de São Paulo.
Há 50 anos, o incêndio do Edifício Joelma, no Centro de São Paulo, deixou 181 mortos e causou um trauma que nunca foi esquecido.
Love Cabaret, na Rua Araújo, quer se tornar um "parque de diversões para adultos" e mostrar diversidade de corpos
O colunista Thiago de Souza fala sobre o incêndio do Edifício Joelma e das 13 almas que pereceram no local
O guia de turismo Laercio Cardoso de Carvalho conta como eram os primeiros carnavais no Centro de São Paulo no começo do século 20.
O Parque do Rio Bixiga, ao lado do Teatro Oficina, já tem uma verba de R$ 51 milhões para sua implantação. O parque vai ocupar […]
A colunista Vera Lúcia Dias, guia de turismo, fala sobre as diferentes fases do Vale do Anhangabaú, por onde já passou um rio
O guia de turismo Laércio Cardoso de Carvalho conta a história de prédios ao redor da Igreja Santa Ifigênia.
O guia de turismo Laércio Cardoso de Carvalho fala sobre a história da igreja Santa Efigênia, que é oficialmente uma basílica.
Espaço, que fica no 42º andar do edifício Mirante do Vale, amplia a área para uma vista de 360 graus e recebe exposição que teve participação do A Vida no Centro
O guia de turismo Laércio Cardoso de Carvalho fala sobre sambistas de São Paulo, homenageados em estátuas no Centro
Clique no botão abaixo para receber notícias sobre o centro de São Paulo no seu email.
Clique aqui não mostrar mais esse popup