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Feira na Rua Coimbra, no Brás, reúne comidas e produtos típicos da Bolívia. Região abriga enorme quantidade de imigrantes bolivianos e outros, como peruanos, equatorianos, haitianos e africanos
Por Maria Lígia Pagenotto e Marcia Minillo, do site Sampa Inesgotável
Fotos Marcia Minillo
Num fim de semana, em um giro pelo Brás, bairro na região centro-leste de São Paulo, descobrimos um pedacinho da cidade que abriga placas indicando peluqueria; ou “hoy se sirve: fricasé; thimpu; sajta; chicharron”.
Nas mercearias, há chuño e tunta (variedades de batatas) à venda; sultana (casca do café torrado) e vários tipos de milho. São duas ou três ruas apenas, em meio às sedes dos maiores templos religiosos do país, e elas estão tomadas por pessoas que se comunicam em espanhol, e até mesmo em dialetos indígenas da região dos Andes, aglomeradas em torno das muitas barracas e lojas de comidas e produtos bolivianos.
Não se trata de uma novidade esse evento: há mais de uma década a rua Coimbra e algumas travessas próximas se tornaram importante ponto de encontro da comunidade boliviana que vive em São Paulo.
A feira acontece aos sábados e domingos. Mas é no sábado que ela realmente ferve – a partir das 15 horas, quando a rua Coimbra é fechada para os carros, o movimento se intensifica.
Nas barracas, além de comidas, há DVDs de filmes e de cantores bolivianos, roupas, cosméticos e artesanato. Um grupo religioso, denominado Iglesia Evangelica Asamblea de Dios Ministro Cristo La Roca Luz para Las Naciones, também integra as atrações da feira, fazendo pregações e distribuindo folhetos. Sábado também é dia de cortar o cabelo nas peluquerias. Algumas chegam a ter fila na porta.
O dia também costuma ser aproveitado pelos estrangeiros para fazer ligações telefônicas para a Bolívia (há muitos locais com cabines próprias para as conversas) e regularizar a documentação. O Centro Boliviano é um espaço que agrega diversos desses serviços, além de assessoria jurídica e contábil, envio de remessas de encomendas para a Bolívia e agência de viagens. Há ainda um posto de assistência médica e odontológica gratuitas, que atende com horários pré-agendados. Uma vez por mês, neste mesmo local, há um mutirão da saúde, onde as pessoas encontram atendimento por ordem de chegada.
Mais de 90% dos frequentadores da feira são bolivianos e o local já é um ponto consagrado de encontro desses imigrantes. Mas há também entre os estrangeiros alguns peruanos, equatorianos e haitianos. Alguns imigrantes de países da África também, vez por outra, vão à feira.
Quase não se vê brasileiros por lá, o que mostra que a feira ainda não foi descoberta por quem mora em São Paulo. Mas, quem aparece, como nós, é bem recebido. E, em poucos minutos percorrendo a rua, o visitante se surpreende, sentindo-se estrangeiro em sua própria cidade.
A oferta de iguarias típicas é o ponto forte da feira. Há muitas barracas de comida e restaurantes para quem prefere comer mais bem acomodado.
Para conhecer um pouco mais da cultura boliviana, vale entrar em um dos mercadinhos que vendem produtos típicos e conversar com os atendentes e proprietários. Há vários deles, com ofertas de enlatados e outros produtos industrializados. O forte, no entanto, é o comércio de batatas, milho de vários tipos, favas e cereais.
Leia aqui uma reportagem sobre os restaurantes da região.
Alicia Flores de Orellana, de 65 anos, está à frente de um desses estabelecimentos – o primeiro do bairro, com 20 anos de funcionamento. Ela toca o negócio junto com o marido, Demetrio Orellana.
No local, além dos produtos alimentícios, há uma variedade imensa de pomadas, vendidas em latinhas, para diversos fins (em geral, dores musculares, mas há unguentos que são indicados até para auxiliar no tratamento de câncer). Alícia também vende suplementos vitamínicos para atletas, importados da Bolívia.
Muito simpática e falante, Alicia explica que há mais de 150 tipos de batatas na Bolívia. No armazém ela comercializa algumas: chuño imilla, pali, sacampaia, pala, luqui, papa liza e a colorida. O milho também tem muitas variações. Os mais vendidos são o maiz pelado (milho branco) e chuspillo. As pimentas também são muito requisitadas pela clientela,entre elas a aji amarillo e a aji rojo.
Veja mais fotos:
Atualmente, a comunidade de bolivianos compõe o mais numeroso grupo estrangeiro em São Paulo. Segundo dados não oficiais, há mais de 300 mil imigrantes da Bolívia vivendo na Grande São Paulo. Em sua maioria, chegaram ao Brasil no início da década de 1990, de acordo com dados do Serviço Pastoral do Migrante, para trabalhar em confecções – ocupação que muitos já exerciam em seu país de origem. Isso explicaria a concentração de bolivianos na zona do Brás, tradicional local de fábricas e lojas de roupas na cidade.
Aliás, foi numa vila de poucas casas, situada na própria rua Coimbra, que se alojaram os primeiros imigrantes da região. A imigração, no entanto, apesar de contínua, é flutuante, pois muitos voltam à Bolívia depois de ficar um tempo em São Paulo.
A comerciante Alicia Flores conta que está entre as fundadoras da Praça Kantuta, localizada no bairro do Canindé, um outro ponto de encontro de bolivianos, que também oferece uma feira, mais famosa do que a da Coimbra. Essa feira na Kantuta nasceu, aliás, de um pequeno conglomerado de bolivianos que se reuniam em uma outra praça, no Pari, no início dos anos 1990, para conversar e matar saudades do país. Esses foram os primeiros imigrantes a chegarem em grupo no Brasil.
Kantuta, diz Alicia, foi o nome escolhido por ela para batizar a praça em referência à flor de mesmo nome, originária da região do altiplano boliviano. Vermelha, a flor tem caule amarelo e folhagem verde, as mesmas cores da bandeira da Bolívia.
Nosso passeio pela pequena Bolívia paulistana terminou com um abraço afetuoso vindo de Alicia, depois de nos ofertar alguns pacotinhos de refresco, balas e fava. “A amizade não se compra, se mantém com muito carinho”, nos respondeu a senhora de sorriso largo.
Serviço: Feira típica de produtos bolivianos – Rua Coimbra entre as ruas Bresser e Dr. Costa Valente – Brás
Sábados e domingos das 15h às 21h
Matéria originalmente publicada no site Sampa Inesgotável.
Pastilhas estão sendo retiradas e serão trocadas por outras semelhantes, segundo nota oficial da Prefeitura de São Paulo.
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