Duas canções e nomes de origem Tupi
A guia de turismo Vera Lucia Dias, autora de um livro com nomes de ruas tupi em São Paulo, fala sobre nomes indígenas em músicas
Vera Lucia Dias
“Logo se deram conta os recém-chegados de que os antigos donos da terra, que inicialmente receberam amistosamente os invasores, como quase-deuses vindos do desconhecido em naus desmesuradas, apesar do tremendo mau cheiro que exalavam em suas roupas abafadas no calor dos trópicos e depois de meses ao mar, já haviam batizado tudo que era lugar, planta e bicho, e passaram a aproveitar esse acervo formidável: Ceará, Paraná, Pernambuco, Piratininga.” Homero Fonseca no livro “Pernambucânia o que há nos nomes das nossas cidades”.
Passeando um pouco por canções que se referem à cidade de São Paulo, descobrimos palavras originadas do tronco linguístico Tupi.
O Centro de São Paulo irradia linhas de transporte e caminhos que ligam os mais de 2 mil bairros. Estes em geral receberam nomes de santos (como Santo Amaro, Santana, Penha) ou denominações indígenas. Atualmente são encontradas aldeias Guarani no extremo sul ou na zona norte. Outras etnias, como Pankararus, também se estabeleceram por aqui.
Podemos observar em muitas músicas referências ao viver e às características da sociedade plural que habita a metrópole, e que mesmo com esse gigantismo ainda oferece oportunidades de encontro e afeto. Aqui temos duas delas.
A primeira, Trem das Onze, do paulista Adoniram Barbosa, gravada em 1964, cita o bairro do Jaçanã.
“Não posso ficar nem mais um minuto com você
Sinto muito amor, mas não pode ser
Moro em Jaçanã
Se eu perder esse trem
Que sai agora às 11 horas, só amanhã de manhã”
JAÇANÃ – “ya-ça-nã”/ iasanã, ave jacanídea, o que grita alto.
Na outra composição, o grupo Premeditando o Breque em 1983 elaborou a letra de São Paulo, onde são citados vários bairros com denominação de origem Tupi. Na letra também estão dois lugares que, mesmo não sendo bairros paulistanos, têm origem indígena, Utinga e Embu.
“É sempre lindo andar na cidade de São Paulo
O clima engana a vida é grana em São Paulo
Tomar um banho no Tietê ou ver tv
Chora Menino, Freguesia do Ó
Carandiru, Mandaqui, aqui
Vila Sônia, Vila Ema, Vila Alpina
Vila Carrão, Morumbi, Pari
Butantã, Utinga. Embu e Imirim
Brás, Brás, Belém
Bom Retiro
Barra Funda
Ermelino Matarazzo, Mooca, Penha, Lapa, Sé
Jabaquara
Pirituba
Tucuruvi, Tatuapé
Um ponto de partida pra subir na vida em São Paulo
Terraço Itália, Jaraguá, Viaduto do Chá”
TIETÊ – rio por excelência
CARANDIRU – carandá, palmeira ou cesto de flores da planta
MANDAQUI – feixes verdes
MORUMBI – morro entre ribeirões ou mosca verde ou marombi, rio dos marombas, peixe ou marumbi, lagoa de taboas
PARI – pesqueiro, canal ou armadilha de taquara para apanhar peixes
BUTANTÃ – “yby-tãtã”, terra dura
UTINGA – rio branco
EMBU – “mboy”, cobra
IMIRIM – rio pequeno
MOOCA – casa de parentes ou fazer casas
JABAQUARA – “yaba-quara”, quilombo, lugar de fugitivos
PIRITUBA – “piri tyba”, onde há muito junco
TUCURUVI – “tukur-oby”, gafanhoto verde
TATUAPÉ – “tatu ape”, no caminho dos tatus
JARAGUÁ – “uyragua”, o senhor do vale ou planta das gramíneas
Com a finalidade de reunir palavras cujos sons ouvimos na cidade, percorri variados livros, dicionários, conversei com nossos representantes Guarani. É tema de difícil pesquisa já que divergem autores e tradutores. E, por vezes, encontramos mais de um significado para a mesma expressão.
O contexto dos falares encontrados na edição do “O Tupi em São Paulo”, livro de minha autoria agora com nova edição, sem buscar aprofundar lições de gramática, propõe trazer luz às denominações, muitas designadas pelos povos originários. Para saber mais sobre o tema recomendo o Método Moderno de Tupi Antigo elaborado pelo Professor Eduardo de Almeida Navarro, Editora Vozes.
“O Tupi em São Paulo – vocabulário de nomes tupis nos bairros paulistanos”
Vera Lucia Dias
Segunda edição revista e atualizada
Como comprar: contato pelo (11) 99253-8846 ou vera@passeiopaulistano.com