A Vida no Centro

Bruno Covas
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Entrevista Bruno Covas: Plano de metas vê o Centro como indutor do crescimento de SP

Em entrevista exclusiva ao A Vida no Centro, prefeito Bruno Covas diz que desenvolvimento do Centro passa pela economia criativa e fala sobre projetos como Triângulo SP e Parque Minhocão, entre outras ações

Por Denize Bacoccina e Clayton Melo

O Centro de São Paulo ocupa um lugar de destaque no plano de metas para o período 2019-2020 apresentado pelo prefeito Bruno Covas. Há vários projetos para a região, como o Triângulo SP, que pretende transformar o Centro Histórico num destino turístico, o aumento expressivo do investimento em zeladoria, iniciativas para reduzir a população em situação de rua e a construção do primeiro trecho do Parque Minhocão, entre outros. Mas como esses projetos vão ser executados? Que resultados podem trazer de fato e em quanto tempo as melhorias poderão ser sentidas pela população?

Foi para falar sobre esses e outros assuntos que o A Vida no Centro entrevistou com exclusividade com o prefeito Bruno Covas. Na entrevista concedida a Denize Bacoccina e Clayton Melo em seu gabinete, o prefeito também falou do papel da economia criativa na retomada do Centro. “A vocação da cidade de São Paulo hoje é a economia criativa”, diz. “Eu entendo que fomentar a economia criativa, fomentar esta que é uma vocação da cidade de São Paulo, passa pela continuidade da revitalização do Centro, ocupar este espaço a partir da economia criativa. É a partir desta visão que nós enxergamos o Centro no nosso plano de metas”, diz ele. “O Centro é o indutor do crescimento da cidade.”

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Leia abaixo a entrevista com o prefeito Bruno Covas.

A Vida no Centro – No Plano de Metas apresentado recentemente há vários projetos para a região central – o Triângulo SP, a questão dos moradores de rua, zeladoria. Qual a importância do Centro para sua gestão?

Bruno Covas – A vocação da cidade de São Paulo hoje é a economia criativa, a economia de baixo carbono. São Paulo já foi a cidade dos barões do café, já foi a cidade que liderou o processo de industrialização do país. Hoje é uma cidade que tem atraído cada vez mais geração de emprego e renda a partir da tecnologia, da informática. Esse é o futuro da cidade de São Paulo. E isso está muito ligado aqui ao Centro. Eu entendo que fomentar a economia criativa, fomentar esta que é uma vocação da cidade de São Paulo, passa pela continuidade da revitalização do Centro, ocupar este espaço a partir da economia criativa. É a partir desta visão que nós enxergamos o Centro no nosso plano de metas.

Entre as metas está a redução do uso de drogas ao ar livre, mas ela é delimitada a um local, a chamada Cracolândia. Isso não pode fazer com essas pessoas se espalhem e assim faça parecer que a meta foi cumprida apenas porque o problema foi transferido de lugar?

Nós vamos lançar uma nova etapa do programa Redenção e no momento apropriado a gente pode falar sobre ele.

Mas ele vai abarcar o Cento todo, a cidade toda?

Nós vamos lançar o programa e a gente faz uma entrevista coletiva sobre isso.

O que gostaríamos de saber é se a ação da prefeitura não vai simplesmente espalhar as pessoas para outros locais sem que o problema seja resolvido.

 Não há mágica. Não dá para simplesmente botar dentro do carro e sumir com elas. É um problema de saúde crônico, um problema grave. Se fosse fácil já teria sido resolvido. Mas estamos buscando as melhores práticas em cidades que resolveram os problemas nas suas cracolândias. Vamos aperfeiçoar o programa Redenção e vamos lançar ainda primeiro semestre de 2019.

Um dos principais problemas do Centro é a limpeza. O plano aumenta os recursos para esse serviço, mas como de fato resolver esse problema?

Estamos finalmente chegando ao final do contrato emergencial e conseguimos tirar do papel a licitação da varrição na cidade de São Paulo. Para você ter uma ideia, quando fizemos a primeira renovação do emergencial, conseguimos uma redução de 5% do preço praticado na gestão anterior. Quando fizemos a segunda renovação do emergencial, conseguimos mais 5% de desconto em relação à primeira renovação e agora na licitação o valor caiu em torno de 30%. O emergencial era muito prejudicial pelo preço, pelo serviço que era feito e pela dificuldade que a Prefeitura tinha em reduzir os pagamentos de acordo com a qualidade dos serviços prestados.

Agora vamos ter um contrato que é mais barato, tem mais possibilidade de glosa de valores por parte da Amlurb e sem sombra de dúvida vai melhorar muito a qualidade desse serviço. Fora isso tem outras ações de zeladoria que estão sob responsabilidade das subprefeituras. E de um gasto médio de R$ 500 milhões por ano em 2019, vamos elevar para R$ 1,5 bilhão. Este é um problema não só do Centro, mas da cidade toda. E estamos também focando numa ação de educação ambiental. A Prefeitura não joga lixo na rua. A Prefeitura só é responsável pela varrição. Se as pessoas não colaborarem, nós vamos continuar a ter essa situação de ter que ficar enxugando gelo e ter que passar por cenas como a gente viu no último verão, com as galerias entupidas por conta da sujeira que é jogada na rua. Estas são as três medidas: o novo contrato, o aumento do orçamento de zeladoria e a educação ambiental.

O senhor acha que isso será suficiente para em pouco tempo haver uma melhoria na questão da limpeza?

Eu queria poder fazer muito mais. Mas com R$ 60 bilhões às vezes não dá para fazer tudo o que a gente deseja. Com estas três frentes, no entanto, a gente espera poder reduzir esse problema drasticamente.

A população vai perceber uma mudança positiva ainda neste ano?

Não tenho a menor dúvida. O contrato deve ter assinado nos próximos 30 dias. E hoje temos dificuldades com as empresas que estão operando e não ganharam o novo contrato. Vai melhorar muito.

 O Triângulo SP quer transformar o Centro Histórico num destino turístico. Em quanto tempo o projeto começará a trazer resultados?

Nós fizemos um pequeno piloto desse programa no Natal no Centro e, praticamente sem nenhum recurso, sem nenhuma campanha, tivemos uma rápida adesão dos estabelecimentos comerciais e também a vinda da população ao Centro para participar dos eventos culturais. Isso nos permite acreditar que vamos ter uma boa resposta a esse programa maior, mais amplo, do Triângulo Histórico, que passa pela requalificação das calçadas, que passa pela melhoria da iluminação, da segurança. Vai ter muito mais ação por parte da prefeitura e eu acredito que a resposta tanto por parte dos comerciantes quanto da população vai ser rápida.

O desafio desse projeto é o gerenciamento intersecretarial?

Tudo o que envolve mais de uma secretaria acaba dificultando, em vez de facilitar. Tem uma cultura muito ruim no país de verticalizar a política pública quando na verdade a questão da Cracolândia – e outras – envolvem ações horizontais, com mais de um tema. A recuperação do Centro não é só uma questão da Secretaria de Turismo. Ela envolve a Secretaria de Assistência Social, Secretaria de Urbanismo, Secretaria de Segurança Urbana, a Secretaria de Subprefeituras. Todas precisam trabalhar conjuntamente. Quando começamos a trabalhar o projeto do Triângulo, a dificuldade foi coordenar todas as pequenas iniciativas que cada secretaria já tinha pensado em fazer, juntando num programa só.

Outra questão que envolve várias secretarias é a dos moradores em situação de rua, que podem ser usuários de drogas ou não, apenas pessoas que perderam o emprego. O plano de metas também prevê redução desse número. Como?

Estamos agora focando no aumento do número de vagas em repúblicas. Constatamos, conversando com moradores em situação de rua, que os albergues grandes, com mais de mil pessoas, são lugares não humanizados, e a rua acaba ficando mais atrativa. Não tem sentido a prefeitura gastar R$ 1,322 bilhão por ano em assistência social e a gente ainda ter problema com moradores em situação de rua. Estamos redirecionando esse investimento para poder tornar esses espaços, que são financiados pela Prefeitura, mais atrativos. Hoje eles preferem ficar na rua a ir para os albergues. Algum problema tem na prestação de serviço.

Nós já ouvimos de um morador de rua que pedia dinheiro para tomar banho que ele não iria para o albergue porque lá há pessoas perigosas lá, com faca.

Eu já ouvi de morador de rua que ele não vai porque ele é tratado pelo número, e não pelo nome.

E como vão ser essas repúblicas?

Vão ser espaços em que ele vai ter mais autonomia, mais liberdade. Como uma república de estudante. Ele vai recuperando a autoestima, vai voltando a se sentir útil, voltando a participar da vida em sociedade. É uma etapa que vai além de simplesmente abrir vaga em albergue. 

O número de pessoas morando na rua é estimado em 20 mil?

Deve ter crescido muito. Com cinco anos de recessão econômica esse problema deve ter aumentado. Por isso nós vamos antecipar um censo, que estava previsto para 2020, para este ano, para que a gente possa redimensionar a ação. O último censo que temos é de 2016, com um número de 15,5 mil. O censo vai ajudar a nortear a solução do problema.

Prefeito Bruno Covas em entrevista aos jornalistas Clayton Melo e Denize Bacoccina, do A Vida no Centro

Prefeito Bruno Covas em entrevista aos jornalistas Clayton Melo e Denize Bacoccina, do A Vida no Centro

O Parque Minhocão, embora já seja muito utilizado pelos moradores, quando foi anunciado gerou reação contrária de boa parte da população da cidade. O parque vai sair mesmo? 

Está no nosso programa de metas. Neste primeiro semestre de 2019, a nossa previsão é terminar o estudo das necessidades de intervenção no viário para minimizar o impacto da implantação do parque nesse primeiro trecho. É importante frisar que já tem uma lei que diz que o Minhocão vai ser desativado como via até 2024 – ou vai virar parque ou será demolido. Nós entendemos que a opção do parque é melhor porque a população já tem utilizado o espaço nos finais de semana e vai utilizar ainda mais. O primeiro trecho tem 900 metros e vai da Praça Roosevelt até o Largo de Santa Cecília. O restante vai continuar sendo utilizado como viário e fica para o prefeito que assumir em 2021 a decisão de continuar a prolongar o parque ou partir para a demolição. No segundo semestre deste ano, vamos soltar os editais, iniciar a construção no primeiro semestre do ano que vem e entregar para a população no segundo semestre. Estamos dentro do cronograma e o secretário Fernando Chucre está tocando isso.

Já tem algum plano definido para a parte de baixo do Minhocão?

Esta é uma questão que tem andado em paralelo, com uma ação da área da cultura, da assistência social, da segurança pública, para ocupar melhor esses espaços e aproveitá-lo como geração de emprego e renda na cidade.

O plano dá destaque para o Centro. Fazia muito tempo que não se via isso, mas falta apenas um ano e meio para o fim da gestão. Vai dar tempo para as ações apresentarem resultados?

O programa é uma adaptação do que já tinha sido elaborado, e tem 71 metas para 2020. Não só para o Centro, mas para a cidade toda. E todas as ações já tem o orçamento previsto.

E qual o papel do Centro nesse plano de metas?

É o indutor do crescimento da cidade. Aqui tem uma vocação para geração de emprego e renda na economia criativa, uma vocação para uma ocupação ainda maior na área habitacional, um espaço muito pouco utilizado. Uma área que tem toda a infraestrutura, que tem emprego para ofertar para a população, mas ainda é mal utilizado, ainda mais numa cidade em que falta espaço.

O senhor quer ser visto como o prefeito que recuperou o Centro?

Olha, eu tenho aí 71 metas para serem entregues, fora outras tantas iniciativas. O que a população vai reconhecer como mais ou menos importante da gestão fica para o futuro.

Sendo cumpridas, essas metas são capazes de transformar a cidade?

Embora o enfoque seja na região central, há ações para a cidade toda. Por exemplo, as mudanças na malha de ônibus. Os contratos serão assinados neste semestre e começam a ser aplicados ainda este ano. Tem ações de zeladoria para toda a cidade. Tem unidades habitacionais em toda a cidade.

Como será a política habitacional, algo que impacta inclusive a ocupação de prédios no Centro?

Vamos entregar 25 mil unidades nesses quatro anos, que é o dobro do que a gestão anterior entregou. Já começamos a PPP que vai entregar mais 13 mil unidades na próxima gestão. E vamos lançar o segundo lote da PPP com mais 11 mil unidades. Se a gente começar a fazer política pensando no déficit de 360 mil unidades a gente vai parar, não vai fazer nada. É preciso focar nisso. É preciso fazer unidades habitacionais. Vamos buscar recursos no governo estadual e federal para fazer mais.

Quando se fala em melhorias no Centro ou boom gastronômico e cultural, tem uma parcela da população que teme a gentrificação. Como o senhor vê essa questão? Tem alguma política pensada para garantir que as pessoas que hoje moram no Centro não sejam expulsas daqui?

Esse é um dos gargalos do projeto Minhocão. Não é só o viário. É evitar a expulsão das pessoas ao longo desses espaços onde está o Minhocão. O secretário Chucre está estudando isso.

Uma das coisas que já está na lei, mas não é colocada em prática, é a questão do uso social dos imóveis. Tem algum plano para isso? A gente vê muitos imóveis fechados, claramente por especulação, se degradando.

Esse foi um processo que se iniciou no final da gestão passada e que nós demos continuidade. São 25 procedimentos necessários para aplicar essa lei. Agora estamos chegando ao fim, para poder utilizar esse instrumento.

A gente sabe que o senhor costumava circular pelo Centro. Dá tempo ainda, continua andando a pé pela região?

Consigo sair para almoçar, dou uma volta por aqui e aos finais de semana também. Mas confesso que está cada vez mais difícil. Uso o transporte público, venho de metrô pelo menos uma vez por semana.

Continua indo na Praça Roosevelt?

Continuo, mas menos. Não posso dizer que vou com a mesma frequência, mas continuo frequentando. O Parque Augusta inclusive vai ser integrador com a Roosevelt e o Minhocão.

Como o senhor avalia o momento atual de efervescência gastronômica no Centro?

Está evoluindo cada vez mais. É impressionante a repercussão que teve uma das iniciativas do governo, o restaurante no Martinelli. Estamos falando de um prédio, de um espaço, mas a repercussão mostra o interesse das pessoas em desfrutar desses espaços. E existem também outras iniciativas, como a do Farol Santander. O sucesso dessas iniciativas mostra como a recuperação do centro tem atratividade.